quarta-feira, 19 de agosto de 2009

A bruxa e a estrada, um velho caso de amor

Era sete da noite. Guy, cansado de uma tarde na praia, mamava bem espaçadamente, de olhos fechados, imóvel e sereno, sinal que já ia dormir. Breno subiu as escadas reclamando de dor de cabeça e se deitou, sinal claro de que já ia capotar. Eu, maquiavelicamente, fiquei bem quietinha. Não buli com Guy, não puxei assunto com Breno. Instintivamente detectei uma oportunidade rara: a de ficar sozinha. Nossa! quantas coisas legais eu poderei fazer quando ficar sozinha, coisas que eu nunca mais fiz, que adoro fazer, e que já até me esquecera. Mas agora! agora parece que vou ficar sozinha-inha-inha de marré-de-ci.

Confirmado. Guy capotou e Breno dormia digamos, feito um bebê. Levantei da cama bem de fininho, sem fazer ruído, sorrateira como um pé de pano, temerosa como quem vai fazer algo de errado. Desci as escadas e quando me vi sozinha mesmo, sabem o que eu fiz?

Nada, maravilhosamente não fiz nada. Aliás, fazer nada é uma atividade profundamente necessária. Sim, que tomei um chá, me depilei, vi o jornal, rodei pela casa, me joguei no sofá. Mas acima de tudo, pensei. Pensar denota tempo e uma certa dose de ociosidade.

Vi que em mim mora ainda aquela bruxinha maluca, doida, incauta, sedutora. Que vive a lucidez e rebentos de criatividade na solidão. E percebi que ela ainda tem o poder de me levar daqui, que ela planeja, aguarda a hora certa. Calma e maquiavélica, ela ainda vai me tirar do sossêgo e me levar dar uma banda pelo mundo. Vai bagunçar toda a nossa vida, bagunçar o que já está certo em mim. Vai gerar polêmica com seus quereres irredutíveis. Vai deixar muita gente preocupada.
Tirar-me do lugar comum de uma vida de casamento terá um efeito certeiro: a própria sobrevivência deste.

Quer saber, não vou fazer a menor força para amarrá-la.

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