segunda-feira, 20 de abril de 2009

Manancial de vidas



Hoje teve a andada dos caranguejos. O espetáculo motriz da vida dos mangues, a grande festa de gala, quando todos os caranguejos, fêmeas e machos, saem para se encontrar. Saem dos mangues, entram nas roças, sobem os esbarrancados, passam pelos quintais, se cruzam. Vão pra lá, vem pra cá, na eterna dança do acasalamento.
O mangue é o berço de toda vida marinha. Há quem se engane com seu cheiro de podre, com sua lama imunda. O cheiro é do que há de mais puro e limpo na natureza. Cuidado com seus pés impregnados da cidade pra não imundiciar essa lama higiênica.
A andada acontece na mesma época, ano após ano, geração após geração. Antigamente a andada atraía assim de gente, seus sacos, caçuás e manzuás, charretes, cômbis, burros de carga, tantos opressores do amor no manguezal, que se aproveitaram da dança do acasalamento para lucrar. Antigamente tinha muito caranguejo.
Apesar da poluição, da opressão e da caça, o amor no mangue persistiu. Persiste. Seu ventre esta repleto de carangueijinhos, aratuzinhos, guaiamunzinhos, peixinhos, gentinhas. O mangue é o ventre do mar. A lama é o ventre do mangue. Meu ventre na lama.
***
Eu sou a terra, sou o ventre, sou a lama - fedida e pura. Dentro de mim fincam suas raízes as árvores. Pra fora cuspo seu fruto. Pra fora da terra, para a vida, para o mundo, pra o que puder devorá-lo. Pra cair no chão e se esbagaçar. O fruto do amor entre a terra e um pé de pau.

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