sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Milan Kundera me console


Em São Paulo sou preta, na Bahia sou branca.
Na Bahia meu cabelo é liso, em São Paulo meu cabelo é ruim.
Eu sempre fui rica de mais para ser considerada pobre,
sempre fui pobre demais para ser rica
Esta pequena dificuldade de enquadramento sempre fez com que eu me sentisse excluída
Nas comunidaes pobres por onde ando, sinto-me culpada por ter uma casa própria, sólida, e por ter o que comer todos os dias.

No metie dos ricos, sinto-me suja, ignorante e desatualizada por não poder compartilhar de suas novidaddes tecnologicas e de seus conceitos de moda. O desejo consumista é superfluo e caro. As vezes passo em frente a uma loja e seus produtos viram objetos de desejo. Crio em mim a necessidade desses produtos, necessidade que não existe de verdade, mas que eu crio e por isso necessito. Por não poder comprar, sinto-me excluída. É semelhante a uma fome. Lógico que não tao grave ou dramatico como passar fome estomacal, mas fico faminta e vou pra casa frustada. com o estômago mental roncando.

Eu e meu marido somos de famílias um tanto abastadas, e tudo o que temos devemos a nossos pais. Sem eles, ou o que eles nos deram, somos pobre-pobre-pobre-de-marré-de-ci.

Pois, quando estou na labuta do meu dia a dia (eu não preciso trabalhar pra comer e isso me torna rica, mas eu passo o dia todo nos afazeres da casa, e isso me revolve à pobreza), penso as vezes em Bruna, que foi a primeira namorada de Breno. (Olhem bem que eu não penso em Bruna com ciúme ou inveja. Acho ela linda mesmo e super legal....apenas a utilizo para fins reflexivos). Breno sempre a descreve como uma garota 'capa de revista'. Linda,
loira, gostosa. Na praia, as pessoas se apressavem em fotografá-la. Se fazia top-less, era briga na certa. E pra melhorar, Bruna é rica. Nasceu rica - o que a torna ainda mais linda. Bruna nunca teve que sujar as unhas no bombril, nunca suou às bicas cavalgado com bravura um rôdo.

Linda, loira e rica. É o ideal de vida que todas as mulheres do mundo gostariam de viver. A vida de Bruna é um sonho. Não é realidade. (Bruna não deve comer pao com manteiga porque é o que tem, nem nunca lhe faltou dinheiro pra comprar um remédio)

As vezes me pergunto se Breno e Bruna tivessem se casado, ela estaria aqui limpando o chão de joelhos, ou estaria Breno empresariando em Salvador?

Me falaram da leveza e do peso. (A mim também Celo)
Será que a leveza da vida de Bruna a levará ao peso por nunca ter tocado a realidade?
Ou talvez eu encontre a leveza no final do dia, quando depois de lavar, cozinhar, limpar, varrer, arrumar, encontre a casa finalmente limpa, ainda que por alguns minutos. Ou ainda, a leveza me venha no final da vida, quando eu olhar pra traz e ver que valeu a pena.....enfim....Milan Kundera, me explique!

Ainda não encontrei a leveza do meu fardo.
Chego ao final do meu dia cansada, pesada. Mais feia, mais velha e secretamente triste.

Triste não porque queria ser rica, ou loira (ainda sou linda tá!), mas porque pra varrer e lavar roupa não é preciso pensar.

Varrer e lavar roupa atrofiam o cérebro. E eu, que adoro pensar, perguntar, estudar, passo o dia todo atrofiando meu cérebro.